Na última terça-feira (29/06), a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso especial (REsp 1.860.630) ajuizado pela empresa “Legião Urbana Produções Artísticas LTDA”, que buscava a rescisão da sentença que garantiu aos músicos Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá o uso da marca Legião Urbana em suas atividades artísticas.
A controvérsia entre os músicos e o herdeiro de Renato Russo girou em torno do art. 129 da Lei de Propriedade Industrial (Lei 9.279/1996), que estabelece que a propriedade de determinada marca se adquire com o registro, assegurando ao titular o uso exclusivo em todo o território nacional.
O pedido de registro do nome junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) foi feito pela referida empresa em 1987, quando seus três integrantes ainda eram sócios. Posteriormente, Dado e Bonfá deixaram a sociedade, vendendo suas partes para Renato Russo. Somente no ano de 2000, 4 anos após a morte do vocalista, o INPI deferiu o pedido de registro da marca, que passou pertencer à empresa herdada por Giuliano Manfredini, filho de Renato.
Dado e Bonfá acionaram o Judiciário, mais de uma década depois, pleiteando o reconhecimento da cotitularidade sobre a marca. A 7ª Vara Empresarial da Comarca do Rio de Janeiro, que julgou a demanda, reconheceu a incompetência da Justiça Estadual para tratar de questões relativas ao registro, pois envolvem o INPI, mas decidiu que os músicos têm direito de utilizar o nome “Legião Urbana” sem autorização do titular, quando se apresentarem profissionalmente. Transitada em julgado a sentença, a empresa ajuizou ação rescisória em face desta decisão.
Em decisão apertada, por desempate do ministro Marco Buzzi, que acompanhou divergência inaugurada pelo ministro Antonio Carlos Ferreira, formando maioria com o ministro Raul Araújo, a favor do guitarrista e do baterista da banda brasiliense. Ficou vencida a relatora do recurso especial, ministra Isabel Gallotti, que foi acompanhada pelo ministro Luis Felipe Salomão.
O ministro Antonio Carlos Ferreira destacou, em seu voto, que o pedido principal para declaração de copropriedade da marca não foi objeto de análise pelo juízo estadual, que se limitou a deferir o pleito dos músicos para que eles pudessem utilizar a marca Legião Urbana em suas apresentações artísticas. Por este motivo, no entendimento do magistrado, não seria necessária a intervenção do INPI na ação, tampouco seria o caso de remessa dos autos à Justiça Federal.
Além disso, o ministro lembrou que a sentença não privou a empresa da titularidade da marca, garantindo aos cofundadores apenas a utilização exclusivamente profissional do nome da banda – para a qual indubitavelmente contribuíram para criação, divulgação e sucesso. Os músicos não poderão comercializar produtos com o nome da marca, nem explorar ou licenciar seu uso para terceiros, prerrogativas que permanecem com a Legião Urbana Produções Artísticas.
A decisão colegiada levou em conta, ainda, o princípio constitucional da função social da propriedade (CF/1988, artigo 5º, inciso XIII), considerando a necessidade de compatibilizar a prerrogativa de exclusividade disciplinada pela LPI com o livre exercício dos direitos autorais correlatos titularizados pelos músicos e com o pleno exercício de sua capacidade profissional. Ressaltou-se que a relevância da marca se deve ao trabalho exitoso de seus integrantes, de modo que é a marca quem deve representar o grupo musical, e não o contrário.
No voto de desempate, o ministro Buzzi apontou que a discussão transcende os limites do direito à propriedade, atingindo a identidade social e artística de Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá, já que envolve patrimônio imaterial que também pertence aos músicos. "A marca está profundamente enraizada na vida pessoal e profissional dos recorridos, que não podem ser tolhidos do direito de identificação com o nome que representa, em grande medida, suas carreiras profissionais e seus legados", afirmou.
Por fim, a decisão ponderou que a utilização do nome Legião Urbana pelos seus ex-integrantes não causará prejuízos à marca, tampouco ao seu detentor. Ao contrário, deve valorizar ainda mais a marca, revigorando o sucesso da banda e ampliando sua divulgação entre as gerações mais novas.
Crédito de fotográfia: TASSO MARCELO/AE